Ai! Triste de quem não tem
No seu exílio escabroso
Ninguém! Ninguém!
Nunca ouvistes as notas várias
Solitárias
Que solta mágica flauta
Quando a lua empalecida
Enternecida
Sobre as águas se retrata?
Nunca viste a flor do prado
Rorejado
Pelo orvalho da manhã,
Desmaiar ao sol lascivo,
Áureo, vivo,
Que vai beijá-la louçã?
Pois como o som afligido,
Ressentido.
Que solta a flauta no ar,
Assim é o meu lamento,
Solto ao vento,
N’ uma noite de luar!
E como a flor perfumada
Desbotada,
Que esmorece ao sol d’ abril,
Assim é esta minh’ alma!
Que sem calma
Sofre dores mais de mil!
Pobre romeira sem guia
Noite e dia,
Sempre, sempre a caminhar!
Olho o porvir tão distante!
Tão distante
Que duvido de o alcançar!
Fito o viver...pesaroso!
Nebuloso!
É procela em alto mar!
Olho as águas vejo horrores!
E só dores
Vêm meu seio agitar!
À sombra a sós dos palmares
Nestes lares
Onde vivo entristecida;
Sou como a rola coitada,
Desprezada,
Longe dos seus sem guarida!
A débil erva na margem ...
Minha imagem!
Deste mundo sobre o mar!
Fito as ondas ... tenho medo!
Vendo-as cedo
Nascer, crescer, rebentar!
Triste da órfã, coitada!
Desgarrada
Folha d’ um cedro senhor...
Canto d’ um livro doirado
Escapado
Entre mágoas, ais, e dor...
Triste da órfã inocente!
Que tremente
Na folha pálida e fria
Do seu funéreo passado,
Amargurado,
Só vê a melancolia!
Flor desbotada e singela
Da capela
De um ataúde arrancada!
Onde abrigar-se estrangeira,
Se na beira
D’ estranho lago é jogada?
Se no reflexo de prata
Que recata
A superfície do lago,
Hórrido véu de tristeza,
De tristeza,
Não lhe dá um riso, afago?
Ai! Não sabem o que é a vida
Umedecida
Pelos prantos da saudade!
E por cantos arrancados
Modulados
No alaúde da orfandade!
Naõ sabem, não! Que a primeira
Lisongeira
Flor que brota o coração,
Se a vestem galas na infância
Tem flagrância
Qual flor longe da soidão!
Porém se crepes, coitada,
Na alvorada
Tem do infantil viver,
Prende a fronte sobre a fria
Melancolia!
Fá-la a saudade morrer!
Júlia da costa – Flores Dispersas 1ª série
Santa Catarina 1867